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A Continuidade

Entra ano, sai ano. Vem aluno, sai aluno. Entra professor, sai professor. O processo é interminável. Eis o como podemos definir o trabalho educativo. Um inacabamento, porque a vida é assim. Enquanto nela estivermos inseridos, participaremos desse percurso contínuo em que as experiências vão sendo compartilhadas. As exigências da aprendizagem formal fazem parte desse compartilhamento e nunca haverá desconexão entre o vivido socialmente e o transformado em conhecimento.

Há muitos educadores que infelizmente não se dispõem a continuar aprendendo. Alegam mil artifícios, que servem como muletas, para dispensar saberes imprescindíveis para seu próprio aprimoramento e dos alunos, especialmente os alunos em maior condição de vulnerabilidade. As reclamações são as de sempre: baixos salários, inabilidade para determinadas tarefas, o descaso dos governantes.

Separando alhos de bugalhos, creio que essas queixas não são resultantes apenas de um problema de formação do educador, mas de falta de disposição e compromisso. A luta por direitos e reconhecimento se dá paralelamente ao comprometimento e o engajamento na formação profissional. Querer abdicar de certas tarefas por entender que “elas não fazem parte de sua função” é antes de tudo um problema ético. Não que certas burocracias não tenham invadido a carreira docente, proletarizando o professor e a professora além do limite do suportável. No entanto, o exercício do magistério é e sempre continuará sendo uma tarefa social.
Um dos critérios que me parecem fundamentais para que qualquer educador pleiteie participar do quadro de gestores de uma unidade escolar deveria ser, além do concurso público, o atestado de compromisso social. Quem poderia certificar essa característica no docente? Penso que a sua história pessoal. Se o educador lutou pela sua categoria, se buscou seu aprimoramento profissional, mesmo em condições adversas, considerando as variáveis de dificuldade em cada caso, será reconhecido como sujeito apto ao exercício coletivo da gestão escolar.

Terá mais condições de perceber que, além de suas próprias necessidades, há necessidades e prioridades na comunidade que precisam ser entendidas como parte desse processo contraditório de injustiças que o atinge. Só assim sua atuação fará sentido, porque conectada à realidade mais ampla.

E é sempre divertido perceber, que quando existe esse vínculo, o educador, mesmo que com o peso dos anos trabalhados, ainda consegue fazer com que por meio de seu desejo, o desejo dos alunos aflore.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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