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A Porta Estreita

Diz a passagem que é larga a porta e espaçoso o caminho que conduz à perdição. Devemos nos esforçar por adentrar pela porta estreita, passar pelo lugar mais difícil, trilhar caminhos que envolvem dificuldades. Como uma metáfora das escolhas sobre valores, o trecho bíblico nos remete à reflexão sobre o que fazer do nosso cotidiano, que posição escolhemos para estar no mundo.

Bem é verdade que nem tudo é escolha. Mas nada justifica a acomodação frente aos desafios que a vida nos interpõe. Há muito por arregaçar as mangas, o mundo precisa de pessoas dispostas a fazer esforços para superar as mazelas que nos afligem. Há causas as mais variadas e complexas, que envolvem a preservação da própria vida, a continuidade de nossa existência. No entanto, há emergências menores, que contornam a convivência humana, desmerecendo a capacidade de projetar, melhorar, que há em todos nós.

Em muitas frentes de trabalho, portanto, encontramos demandas cujos enfrentamentos são imprescindíveis.  Mas a lamúria e a autopiedade parecem tomar conta de muitos de nós, fase ou outra. Em alguns, essa condição parece se instalar permanentemente. Não há coragem suficiente para enfrentar a vida como ela é. Daí nossas projeções, intermináveis reclamações dirigidas ao outro, o motivo de nossa infelicidade. Dizem os filósofos que para haver liberdade é necessário que exista o outro. O campo da convivência define nossos rumos e opções, os valores que balizam nossa conduta.

A imbecilização da vida caminha ao lado dos projetos mais humanos, largos, nossos e coletivos, sobre os quais, muitas vezes, nem sequer tomamos conhecimento. Como dizia Madre Teresa de Calcutá, a revolução inicia no momento em que voltamos para casa e lá damos forma a uma caminhada em direção ao bem viver. Sem este esforço individual, circunscrito a mediações históricas, não pode haver mudança.

Infelizmente, muitos escolhem o caminho da eterna queixa, a crítica constante. Sobre essa prática também dizia a religiosa, “as críticas não são outra coisa que orgulho dissimulado. Uma alma sincera para consigo mesmo nunca se rebaixará à crítica. A crítica é o câncer do coração.” Os que aceitam a tarefa de pensar ao longe, o bem comum, sempre serão alvo de críticas. E os críticos, não os críticos sinceros e que colaboram com o aprimoramento social, mas os críticos menores, não merecem o tempo precioso de nossa dedicação.
Dedicação que encontramos no trabalho compassado dos simples e humildes, na sala de aula, na rua, nos escritórios, nas agremiações políticas, nas igrejas. Intrigas sempre haverá. E a porta larga sempre será o caminho mais fácil para acolhê-las.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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