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Cultura e Educação

A apologia do valor da cultura como elemento indispensável para o desenvolvimento de uma sociedade nem sempre é fruto da coerência de quem fala. Retóricas à parte, de fato, não há como desvencilhar emancipação humana da conexão entre o trabalho educativo e as experiências culturais. Há vários sentidos que são atribuídos ao conceito de cultura. Em geral, há uma tendência em percebê-lo como a promoção das chamadas belas artes. Uma visão restrita.

Historiadores como Edward Thompson identificam cultura como experiência. Thompson indica que cultura é o vivido, a luta, os valores, as reações, as conformidades e adaptações dos sujeitos ao mundo social. Criação ou desdobramento das vivências individuais ou coletivas, a cultura flui em multiplicidades. Daí seu imbricamento, inevitável, com o processo educativo. As dinâmicas educativas tanto quanto as diferentes culturas não podem ser mensuradas de forma mecânica. Há essa fluidez que sugerem e que quase sempre não é compreendida como valor mesmo dessa confluência.

Educação como processo e cultura como vivência interminável de experiências diversas são esquisitices aos olhos das burocracias oficialescas. Os espaços da cultura onde as experiências acontecem e se registram as memórias são relegados a segundo plano. O que importa é “garantir o espetáculo”, derrubando, se for necessário, bens públicos inestimáveis no amplo espectro da preservação patrimonial. Eis a prova da contradição entre o que se diz e o que se faz.

De maneira menos visível, mas lenta, mudanças de baixo para cima vão sendo construídas, especialmente por parte de quem não deseja muita visibilidade. Programas, projetos, junções de esforços entre diferentes atores apontam o caminho que se faz ao caminhar. Não há como desconstruir as burocracias educacionais sem ampliar repertórios culturais. Currículos e dinâmicas educativas sem vida precisam ser repensados. Temáticas ambientais, realidades culturais específicas de cada comunidade escolar, diversidades várias, precisam se constituir como mote das mudanças que necessitamos para um novo jeito de viver na cidade.

Estreitar as relações entre o dia a dia das escolas e o mundo da cultura é imperativo para que as transformações sociais ocorram. Nada de shows em praças públicas ou espetáculos ao ar livre tão somente. Há que se investir, ao contrário, nesse “chão da sociedade” que são as escolas, onde nossas crianças passam a maior parte do tempo. Educar é proporcionar vivências culturais diversas, dentro e fora da escola. Sem compreender essa verdade, reproduziremos o fracasso educacional.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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