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Haja Paciência

Uma das virtudes centrais imprescindíveis para o convívio cotidiano com as pessoas, a paciência anda em falta. Em parte por conta dos pragmatismos e da falta do senso de justiça. Todos possuem soluções mirabolantes e fáceis para problemas complexos, seja na vida de trabalho, no contexto afetivo-familiar, nos valores, nas formas de entendimento sobre a realidade. Também operam em favor da impaciência, interesses e agressividades, vontade de marcar posição desnecessariamente.

Há muitos exemplos na história da humanidade, no entanto, que sugerem a possibilidade de uma vida em que a paciência prevaleça. Paulo Freire sempre dizia que é inútil reagir a ofensas e ataques. Recentemente o historiador Leandro Karnal asseverou em uma entrevista que a ofensa é a mais pura demonstração de fracasso dos que ofendem. Mortes ocorreram por causa da paciência e do espírito de paz, de Gandhi a Martin Luther King. Mais paradoxal ainda é quando os ataques provém dos que deveriam primar pelo bem comum, como as pessoas que se diziam religiosas e que promoveram a morte do homem da grande alma.

Cultivar a paciência depende, em parte, do grau de autoconhecimento de cada um, das experiências de vida. De outra parte, como sugere Leandro Karnal, ela emana do simples exercício da racionalidade. Quando analisamos situações sem o peso da emotividade, verificamos a falta de necessidade de ficarmos impacientes diante da impaciência que nos rodeia.

Ponto pacífico de todo processo civilizatório é o equilíbrio entre extremos perniciosos. De um lado a soberba e de outro o excesso de humildade. Nem tanto o céu, nem tanto a terra. Equilíbrio parcimonioso só resulta do conhecimento sobre si mesmo, que não cai do céu de mão beijada. Para quem pretende um mínimo do mínimo de autoconsciência, já muitas de nossas motivações são de ordem inconsciente, nada como uma boa terapia. Ver-se consigo mesmo não é tarefa para muitos, a maioria das pessoas busca subterfúgios nas projeções, como mencionei no artigo anterior.

Estabelecer uma cultura da paz em que a paciência seja um elemento fundante, depende da ação de cada um e também dos processos educacionais mais longos, que implicam o desapego da ideia de que há aqueles que sempre tem razão e aqueles que não tem. Haja paciência, santa modéstia.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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