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História em Curso

A história é um processo aberto. Nunca haverá inexorabilidadeUma verdade que sempre esteve em discussão, desde Heráclito e Parmênides, mas que o tempo deu conta de resolver. Tudo muda, apesar de algumas realidades parecerem imutáveis. Os historiadores são esses profissionais do fascínio pela mudança. Ao contrário do que se imagina, eles não vivem de “provar” o que aconteceu no passado. Apenas se valem de peças que vão sendo juntadas, analisando contextos que resultam em interpretações mais ou menos factíveis, a partir do que se vive no presente.

Uma das formas de arquitetar interpretações é o resgate documental. Hoje temos várias fontes disponíveis e a velocidade da informação, com os novos veículos de comunicação, faz com que em menos de horas tenhamos confirmados dados que podem resultar em mudanças que nem sempre imaginamos. Um pouco de curiosidade ajuda bastante.

Foi o que aconteceu comigo nas últimas semanas. Como descendente de italianos, faz décadas que venho pesquisando minhas origens familiares. Uma conversa aqui, um dado ali, os relatos que partem da memória vivida pelos mais velhos, fazem a gente compor um cenário. Havia uma dúvida sobre o nome de um de meus bisavôs. Alguns parentes criaram uma página da família no facebook. Uma das minhas primas em segundo grau questionou se havia algum documento que pudesse dissipar essa dúvida. Lembrei-me que havia conseguido um documento por meio eletrônico, diretamente da cidade de onde veio uma outra antepassada, de outro ramo familiar.

Um simples email para o setor de registro civil da cidade de origem de meu bisavô e a indicação de alguns dados simples fizeram com que em poucos dias chegasse uma correspondência que desfez a dúvida. Meu bisavô, aqui sempre chamado de Ence Leoni, se chamava, na verdade, Enzo Leoni. As dificuldades de comunicação, as diferenças entre os dialetos falados na Itália no final do século XIX, a falta de letramento dos imigrantes, provocaram distorções na grafia de muitos nomes e sobrenomes quando estes chegavam ao Brasil.

Felizmente, para minha sorte e de meus familiares, tudo foi acertado com o tempo, o tempo da mudança. Um simples nome? Não, todo um significado, uma identidade que, paradoxalmente foi construída a partir da troca de duas letrinhas. Muito interessante. Para quem vive de caçar documentos, uma dádiva, um deleite.

Vivendo de esperanças e expectativas de mudança, os historiadores ensejam, mesmo por meio de um simples documento, que dias melhores podem vir, a despeito das intempéries e contrariedades pessoais e coletivas às quais estamos submetidos.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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