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Paulo Freire: 18 anos

Nunca deixo passar. O registro constante, anual, em sua data de nascimento e de morte, se faz uma marca entre meus modestos artigos. Não porque o idealize como intelectual sem retoques, já que isso seria contradizer sua própria teoria. Você era pessoa simples, um ser humano normal, dedicado à causa de educação como poucos.

Não preciso repetir seus feitos. Eles estão marcados nos processos históricos mais largos, do Brasil e do mundo. Quem mais o conhece, sabe que suas contribuições intelectuais foram muito acima da média. Acusam-no de todas as coisas. De um lado, dizem que você era um liberal enrustido. De outro, um doutrinador esquerdista. Vai entender essa gente! Como pode alguém ser duas coisas ao mesmo tempo?

As influências teóricas foram muitas, nenhuma em especial o determinou como discípulo de alguém ou criador de novo gueto, comportamento totalmente desconectado do livre pensamento. Ao contrário, seus postulados abertos e dinâmicos aproveitavam todas as contribuições que vieram do pragmatismo, do personalismo, da fenomenologia, do existencialismo, do marxismo e mais no final da vida, da teoria crítica da sociedade. Henry Giroux o classifica como pai da Pedagogia Crítica. Talvez você recusasse esse título. Afinal, rótulos e títulos nunca o envaideceram.

No teatro da PUC, o TUCA, você foi acolhido sob aplausos intermináveis, quando da sua volta ao Brasil, narra em vídeo Alípio Casali. Perguntaram-lhe justamente isso, se não se sentia envaidecido. Resposta inesperada: “não, porque quem aplaude se reconhece no outro e, no fundo, aplaude a si mesmo”. A vaia não, completou, ela serve para minimizar o outro. Eis uma grande questão educacional, muito pertinente para o momento presente: de que maneira nos comportamos em relação ao outro? Aplaudir-se no outro não tem sido prática comum, o que revela que talvez não tenhamos tantas coisas boas em nós.

Como se vê, ainda falta muito para aprenderem contigo. Educar é conviver com a contradição sem perder a compostura. A contradição social, política, econômica, ideológica, de todos os tipos. A tolerância, não como o “ter que aguentar o outro”, mas como mecanismo implícito ao processo dialógico, que você tanto defendeu, parece não se constituir como fundamento da prática educativa.

Paradoxalmente você ainda é visto como dogmático e ideologizador, mesmo tendo proposto a radicalidade democrática e a dialogicidade. São as pequenezas do conhecimento, que se reproduzem como ervas daninhas. Em sua grandeza espiritual, você agora completa dezoito anos de passamento, neste dia 02 de maio. Um dia após o dia do trabalhador. Exatamente! Um trabalhador incansável pelo bem social do Brasil.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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