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Plínio, o Pleno

Grandes homens não são reconhecidos apenas por suas ideologias. As ideologias serão sempre passíveis de concordâncias ou discordâncias. A postura diante da vida, o caráter, a coerência são os atributos que definem uma personalidade singular. A relação entre o nome da pessoa e sua posição no mundo atesta essa verdade. Na última semana perdemos um grande brasileiro. Seu nome era Plínio Soares de Arruda Sampaio. Plínio significa “completo”, “pleno”.

No início dos anos 80 eu era um jovem militante da Pastoral da Juventude. Naqueles meus 20 e poucos anos, entre muitas lembranças, aparece uma palestra numa das paróquias da cidade de Salto, com um especialista em reforma agrária. Diziam que era um grande entendedor dessa questão. Como a igreja estava aberta para questões sociais, fomos ouvir o que ele tinha para falar. Era Plínio de Arruda Sampaio.

No ano em que nasci ele tinha sido eleito deputado federal pela primeira vez, com o Partido Democrata Cristão. Atuava como uma das pilastras do governo de João Goulart. Um dos acontecimentos mais impressionantes da história da educação brasileira foi uma reunião da qual participou, a convite do então ministro da educação, Paulo de Tarso Santos. Tratava-se de apresentar o novo coordenador nacional do programa nacional de alfabetização de adultos, um pernambucano que revolucionaria a educação popular contemporânea, Paulo Freire.

Anos mais tarde, no exílio, Plínio se encontraria com Paulo Freire no Chile. Um relato feito por ele em um documentário diz que Paulo apresentou um manuscrito para sua apreciação. Plínio achava que necessitava de reparos. Paulo não esboçou reação e publicou sem alterações, pouco tempo depois. A Pedagogia do Oprimido se tornaria uma obra prima da educação mundial. Pesquisador dedicado, Plínio mudou-se para o EUA em 1970 para trabalhar como consultor no programa da FAO/BID, em Washington, cursando seu mestrado em Economia Agrícola na Universidade de Cornell. Em 1976 retornou ao Brasil e tornou-se docente da Fundação Getúlio Vargas. Era um cristão convicto e manteve acesa a esperança de uma junção entre cristianismo e socialismo democrático, até o final da vida.

Suas principais amizades foram nomes especialíssimos da intelectualidade brasileira e mundial, fazendo jus à grandeza que possuía, por colocá-la no devido lugar, o campo da humildade. Em suas exéquias, depoimentos deram conta de que seu otimismo o impedia de tripudiar sobre o sofrimento, a desgraça, a derrota, vendo sempre uma luz no horizonte, como é próprio dos homens que cultivam utopias. Lutou por um Brasil justo e solidário e fez desse ideário sua coerência.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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